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Quando a Dor se Torna Personalidade: Como o Trauma se Esconde em Você
Nesta conversa poderosa, ele revela como as experiências da infância — mesmo que você não perceba — impactam seus relacionamentos, sua autoestima e a forma como você vive a vida. Você vai entender por que o trauma, o estresse, o vício e a necessidade de agradar os outros não são apenas traços de personalidade, mas padrões de sobrevivência formados nos seus primeiros anos de vida.
E o mais importante: você vai descobrir que, embora o que aconteceu com você não seja sua culpa, a cura é sua responsabilidade. Essa conversa vai desafiar a forma como você se enxerga — e te dará as ferramentas para assumir o controle do seu futuro.
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"'Lide com suas questões emocionais, senão vai passá-las aos seus filhos'" - Gabor Maté
'Vícios têm origem em traumas e não estamos atacando as causas do problema'
Por Olivia Lang Role para BBC World Service em 18 novembro 2019.
Qual é a sua opinião sobre dependência química?
O médico canadense Gabor Maté acredita que precisamos repensar nossa abordagem ao assunto.
O especialista e escritor best-seller ficou conhecido por seu trabalho sobre saúde mental com pacientes que sofrem com abuso de substâncias na área central de Vancouver.
Essa região da cidade canadense apresenta a maior concentração de uso de drogas na América do Norte.
Em 2018, ele recebeu a Ordem do Canadá, a mais alta condecoração civil do país, por seu trabalho.
No centro de sua abordagem, está a ideia de que todo vício tem origem em um trauma — e nem sempre é possível identificá-lo.
Maté elenca, em suas próprias palavras, cinco pontos que nós não entendemos sobre o problema.
'Nós não estamos tratando a causa real do problema'
Para entender o que leva ao vício, é necessário observar seus benefícios. O que ele faz por você?
As pessoas costumam dizer que o vício "oferecia um alívio para a dor, uma saída para o estresse, dava um senso de conexão, uma noção de controle, de significado, a sensação de estar vivo, entusiasmo, vitalidade".
Em outras palavras, o vício preencheu uma necessidade humana que era essencial, mas que não tinha sido satisfeita na vida daquela pessoa.
Todos esses estados — da ausência de conexão e do isolamento até o estresse no dia a dia — eram de dor emocional.
Então, o que se deve perguntar sobre dependência química não é "qual é o vício?" mas sim "qual é a dor?".
Quando se olha para uma população de dependentes químicos, o que se observa é que quanto mais adversidades na infância, maior o risco de dependência.
Então, o vício está sempre relacionada ao trauma e às adversidades na infância — o que não significa que todas as pessoas traumatizadas se tornarão dependentes, mas que todos os dependentes passaram por traumas.
Alcoolismo: como o álcool altera nosso DNA e nos faz querer beber ainda mais
O tratamento para isso exige muita compaixão, muita ajuda e muita compreensão, em vez de consequências severas, medidas punitivas e exclusão.
Você imaginaria que, com a falha da maioria dos tratamentos, nós tomaríamos consciência e nos perguntaríamos, "será que entendemos de fato essa condição?".
Mas isso não acontece muito no mundo médico.
Nós não estamos encarando sua real natureza, como resposta ao sofrimento humano.
Não estamos ajudando as pessoas a lidar com seus traumas e resolvê-los. O típico estudante de medicina nos Estados Unidos não participa de uma aula sequer sobre trauma emocional.
Nós continuamos a perguntar "o que está errado com você?", quando deveríamos perguntar "o que aconteceu com você?".
O vício não é uma escolha
Outro mito sobre dependência química é de que seria uma escolha das pessoas que sofrem com ela.
Todo o sistema legal baseia-se nessa ideia, então vamos puni-las para impedir outras de fazer essa escolha.
Ninguém que eu conheça acordou em uma manhã e disse "meu objetivo é me tornar um dependente químico".
O vício não é uma escolha que se faça, é uma resposta à dor emocional.
E ninguém escolhe sentir dor.
O vício não é genético
Um dos maiores mitos sobre dependência é de que seria algo genético.
Sim, isso vem de família. Mas por quê?
Se eu sou alcoólatra e grito com meus filhos, que crescem e também recorrem ao álcool, eu transmiti isso a eles geneticamente?
Ou isso se trata de um comportamento que eles desenvolveram porque eu reproduzi as mesmas condições em que cresci?
Ter algo do tipo na família não diz nada sobre uma causa genética.
Pode haver uma predisposição genética, mas isso não é o mesmo que uma predeterminação — ou seja, não significa que você seja geneticamente programado para ter um vício.
Dependência química é comum
Outro mito é o de que o vício está restrito ao dependente químico, ou a alguns fracassados na nossa sociedade.
Mas ela é comum e alarmante em nossa cultura.
Quando observo essa sociedade, vejo vícios em quase todos os níveis, diversas compulsões. Mais do que isso, vejo toda uma economia baseada em atender a esses vícios.
Você pode se viciar em praticamente qualquer coisa — até mesmo em música clássica
A dependência se manifesta em qualquer comportamento em que a pessoa encontre um prazer ou alívio temporário, e que passe a desejar intensamente. A pessoa, então, sofre as consequências negativas como resultado, mas não para — ou não consegue parar — apesar dos desdobramentos ruins.
Isso pode incluir drogas, álcool, substâncias de todos os tipos.
Também pode se relacionar a sexo, a jogos de azar, a compras, ao trabalho, a poder político, a jogos online... Praticamente todas as atividades podem ser viciantes, dependendo da nossa relação com elas.
Contanto que haja constante desejo e alívio, com consequências negativas a longo prazo, e dificuldade de simplesmente parar, você tem um vício.
Eu tive dois grandes vícios. Um deles era o trabalho, que me levou a ignorar minhas próprias necessidades e as da minha família para buscar sucesso e satisfação profissional.
Essa dependência baseava-se em um sentimento profundo de que eu não era bom o bastante, de que precisava me provar, e em uma crença inconsciente de que eu não poderia ser amado e querido.
O mundo, então, recompensa esse "workaholic altruísta".
Eu também tive um vício em compras, em especial de CDs de música clássica. Em um único dia, gastei 8 mil dólares em CDs.
Meu vício não era a música em si. Sim, eu amava a música, mas era viciado no ato de comprar.
Não importava quantas coleções eu tivesse de um determinado compositor, eu tinha de comprar outra e mais outra.
Por esse vício, eu cheguei a deixar uma das minhas pacientes em trabalho de parto, fui comprar um CD e perdi o nascimento do bebê. Esse era o impacto que a dependência tinha em mim.
Talvez você pense que essa comparação é risível — como poderia comparar tal vício ao de pacientes dependentes de heroína?
Mas meus próprios pacientes não riam quando eu contava a eles sobre isso.
Eles balançavam a cabeça e diziam "é, doutor, a gente entende, você é como todos nós".
O ponto é que assim somos todos nós.
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No dia 6 de maio, há 169 anos, nascia o fundador da Psicanálise.
Para mim, um eterno apaixonado pela mente humana, é fascinante notar como a psicanálise, mesmo após mais de um século, continua a ser uma força potente e cheia de perspectivas surpreendentes. Sua influência se estende por diversas áreas, desde a óbvia da psicoterapia até a compreensão mais profunda da cultura e da sociedade de forma geral.
Cuidado com saúde mental vira exigência legal nas empresas
Apartir de 25 de maio, empresas que atuam no Brasil precisarão incluir a saúde mental em sua lista de responsabilidades obrigatórias — da mesma forma que já fazem com os equipamentos de proteção individual (EPIs), como capacetes, luvas ou máscaras. A nova versão da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), do Ministério do Trabalho e Emprego, passa a exigir o mapeamento e gerenciamento dos riscos psicossociais — fatores organizacionais, culturais e relacionais que podem contribuir para o adoecimento mental dos trabalhadores.
A regulamentação surge em meio a um cenário preocupante: em 2024, o Brasil registrou mais de 472 000 afastamentos por motivos de saúde mental, o maior número da última década e um aumento de 68% em relação ao ano anterior. Os transtornos de ansiedade lideram os afastamentos, seguidos pelos casos de depressão, de acordo com dados do Ministério da Previdência Social.
A novidade trazida pela NR-1 não está em reconhecer que o trabalho pode causar doença, mas em exigir uma gestão sistemática e preventiva de fatores de risco. Tatiana Pimenta, presidente da Vittude, plataforma de terapia on-line e consultoria em saúde corporativa, explica que a norma vai além dos programas tradicionais que muitas empresas já mantêm. “O fato de uma empresa ter um programa de saúde mental e oferecer consulta psicológica não significa que ela está fazendo gerenciamento de riscos psicossociais”, diz Tatiana.
Ela ressalta que consultas psicológicas isoladas ou ações pontuais não são suficientes para lidar com sobrecarga, metas abusivas ou lideranças tóxicas. É necessário aplicar instrumentos objetivos, como escalas psicométricas, para mensurar variáveis como risco de burnout, assédio ou ideação suicida. Esses dados também podem indicar onde há perda de produtividade e maior rotatividade. Ainda assim, observa Tatiana, as empresas têm se mostrado resistentes à mudança.

Isso se manifesta, por exemplo, em iniciativas como a da FecomercioSP, entidade que representa o setor de varejo e serviços no estado de São Paulo. Em abril, a federação solicitou ao governo a prorrogação da entrada em vigência da norma por um ano, alegando que as mudanças trariam custos extras e incertezas na fiscalização, especialmente para pequenas e médias empresas.
A percepção de que o tema é subjetivo demais para ser regulamentado ainda é comum. Fatima Macedo, diretora de certificação e excelência da Associação Brasileira de Qualidade de Vida (ABQV), ressalta que esse é um equívoco. “Quando muita gente sente o mesmo, isso deixa de ser só percepção”, afirma Fatima. Ela explica que, embora se trate de questões emocionais, é possível mensurá-las com consistência e comparabilidade — quando diversos colaboradores apontam os mesmos problemas, o dado se torna quantitativo e, portanto, passível de gestão.
Fatima também lembra que outras normas, como a NR-17, já mencionavam os riscos psicossociais. A diferença agora é que a NR-1 dá muito mais destaque para a obrigatoriedade de gerir os fatores psicossociais — e, com isso, pode haver consequências jurídicas.
Algumas empresas já vêm aplicando estratégias mais estruturadas de cuidado e prevenção à saúde mental. A Nestlé Brasil lançou, em 2024, o projeto Parceiros do B.E.M., em parceria com o Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo e pretende investir 1,5 milhão de reais no programa ao longo de 2025. A iniciativa visa a capacitar 600 funcionários para reconhecer sinais de sofrimento psíquico e orientar colegas aos canais de apoio da empresa. Fabricio Pavarin, gerente-executivo de saúde e bem-estar da Nestlé, explica que a estratégia começou com a desmistificação do tema junto às lideranças, em conversas com o presidente da empresa e em lives com os funcionários. “Procurar ajuda para problemas de saúde mental precisa se tornar tão natural quanto procurar atendimento porque quebrou o braço”, afirma Pavarin. Ele reconhece que, ao dar visibilidade ao tema, é possível que os números “piorem” inicialmente, mas esse movimento é esperado e necessário.
“O livre-arbítrio é um mito”
“O livre-arbítrio é um mito”
É o que diz diz Robert Sapolsky, neurocientista de Stanford. O polêmico pesquisador defende em um best-seller que as escolhas que fazemos no dia a dia são determinadas por fatores genéticos e ambientais.
Escrito por Amanda Péchy Publicado em 4 abr 2025.
Um dos mais polêmicos figurões da academia americana, Robert Sapolsky, 67 anos, tem um olhar todo próprio sobre a neurociência, área em que é ph.D. e ensina na prestigiada Universidade Stanford, na Califórnia. Há mais de três décadas, ele vem examinando o cérebro para decifrar assuntos que causam aflição à espécie humana, como o estresse e, mais recentemente, as engrenagens por trás da tomada de decisões — tema que atiça a curiosidade científica e ao qual ele dá uma roupagem única. Com base em vastos estudos, o especialista que cultiva uma farta barba branca diz que a escolha dos indivíduos está quase que inteiramente dada por fatores genéticos e ambientais. É esse o combustível de seu recém-lançado Determinados: a Ciência da Vida sem Livre-Arbítrio (Companhia das Letras), best-seller nos Estados Unidos. De sua casa vizinha a Stanford, ele falou a VEJA.
Em tempos de maior complexidade e turbulências, como o que estamos vivendo, é mais difícil para os indivíduos tomar decisões? Sem dúvida. Existem momentos históricos em que a irracionalidade, uma marca humana, se pronuncia em graus especialmente elevados. É o que estamos observando agora. Isso tem a ver com a presença de guerras, com as incertezas acirradas e com as rachaduras de sociedades polarizadas. Um ambiente inflamado pelo ódio, circunscrito a uma lógica do “nós contra eles”, gera medo e desencadeia um ciclo vicioso que atrapalha a tomada de decisões — uma ebulição que tem o cérebro como cenário.
Em que medida a neurociência ajuda a explicar a irracionalidade? As pessoas ficam mais estressadas em eras tomadas por agitação, o que, do ponto de vista individual, libera hormônios que ativam estruturas no cérebro relacionadas às emoções, perturbando a função reflexiva do córtex frontal, que nos faz pensar antes de agir. Daí a propensão a comportamentos mais impulsivos, com tendência, inclusive, à radicalização e ao extremismo.
Por que suas conclusões sobre o processo humano de tomada de decisões são objeto de tanta polêmica nos círculos acadêmicos? Durante décadas, à luz da ciência, constatei que as pessoas alimentam a ilusão do poder de escolha, quando, na verdade, o livre-arbítrio é um mito. Isso quer dizer que os indivíduos estão quase 100% programados a optar por esse ou aquele caminho nos vários escaninhos da vida. As decisões das pessoas são definidas por uma soma da genética com o ambiente que as cerca e as experiências que têm — estas, também, modeladoras do DNA. Tudo está praticamente escrito em nós, uma ideia que colide com várias correntes de pensamento.
“Existem momentos históricos em que a irracionalidade, uma marca humana, se pronuncia em graus mais elevados. É o que estamos observando agora”
Qual o espaço, afinal, para o indivíduo se aprimorar e arbitrar de forma mais sábia? As pessoas podem amadurecer, recorrer à psicanálise de Freud e evoluir em áreas diversas. O cérebro é maleável e se transforma em resposta às experiências. Agora, há limites aí. A psicanálise fornece novas perspectivas que fazem sacudir padrões de pensamento e comportamento. Mas a maneira como circunstâncias alheias à nossa vontade nos marcam, do ponto de vista biológico, seguirá determinante para as decisões que tomamos. Tenho, porém, uma visão otimista: podemos mudar o suficiente para que a vida seja mais bem vivida.
Em outros termos, temos pouco controle sobre nossas escolhas? Isso. Claro que uma porção importante do cérebro ajuda a pensarmos antes de tomar uma decisão. Como ela só se desenvolve por completo na idade adulta, os adolescentes são, em geral, mais impulsivos. Só que mesmo essa área ligada à razão é afetada por um conjunto de eventos tatuado no cérebro, o que torna a maior parte das escolhas que fazemos quase inescapável.
O senhor já afirmou que a crença da espécie humana de que tem elevado comando sobre os rumos de sua existência — e de suas decisões — é uma ferramenta evolutiva. Pode explicar melhor? Os humanos possuem uma série de mecanismos que os permitem negar a realidade, a fim de viver melhor. Todo mundo sabe que a morte é inexorável, mas seria doloroso demais passar 24 horas às voltas com essa ideia. Esquecer é uma ferramenta de sobrevivência.
Até que ponto a razão influencia o comportamento das pessoas? A ideia da racionalidade da espécie é outro mito. Os indivíduos têm a impressão de que é a mente que os move para certa direção, mas as emoções têm peso equivalente. Um estudo que fiz na arena da política, sobre eleições, comprova, a partir da neurociência, que o voto não se define pelas ideias de um candidato. Decisivo mesmo são os sentimentos que provoca e quanto eles têm eco nos medos e ansiedades de cada um.
Decisões de cunho político são também predeterminadas, ou estão mais sujeitas às circunstâncias? Elas entram no rol das outras, sob a mesma lógica. Veja o presidente americano Donald Trump, o mais controverso líder da atualidade. Diria que é um caso exemplar de como a combinação de genética e ambiente produz um humano capaz de ações pouco empáticas. O pai era um vigarista imobiliário e a mãe, um freezer no campo do carinho e do cuidado. Ele passou toda a vida sem saber se pessoas ao seu redor o amavam ou se só estavam ali por dinheiro. Não dá para esperar algo muito diferente do que estamos assistindo.
Visão tão determinista não o aflige? Sim, é claro que me atormenta. Entender cientificamente as raízes dos equívocos humanos não significa que eles não causem repulsa.
Revisitando um caso extremo, como o de Adolf Hitler, que exterminou milhões de pessoas na Segunda Guerra, dá para afirmar que o mal também é predeterminado pela biologia? Não existe algo como um “gene do mal” que o predestinasse a cometer genocídio. O DNA diz respeito a potenciais, não a inevitabilidades. O ambiente em que Hitler estava imerso teve papel crucial em sua sombria trajetória, o que inclui uma infância complicada, o trauma da Primeira Guerra, a crise econômica, a ascensão do nacionalismo — tudo isso alterou seu funcionamento, exacerbando o que pode ser lido como uma propensão à maldade.
Pode explicar melhor, sob o ângulo da biologia, como o ambiente impacta as escolhas que fazemos? Cientistas odeiam falar o que vou dizer aqui: não há exatamente como saber. Mas existem indícios interessantes. Já foi descoberta, por exemplo, uma variante genética relacionada à serotonina, o chamado hormônio da felicidade, que supostamente prevê níveis de agressividade. Curioso é que ela só é ativada em um único cenário — aquele em que o indivíduo foi criado em um contexto abusivo. Genética e ambiente caminham sempre juntos, delineando quem somos e como agimos.
Essa ideia de que as pessoas são tão programadas não faz o humano se assemelhar demais a uma máquina? Somos máquinas biológicas, sim. A diferença para a inteligência artificial é que humanos se revelam mais multifacetados, tendo a consciência de quais são nossos botões e onde estão. É um sistema sofisticado, mas não chega a dar para se gabar, não. As mesmas enzimas cinases que acendem receptores quando aprendemos algo estão presentes nos cérebros de lesmas-marinhas.
Se praticamente tudo já está escrito, por que é tão difícil prever o amanhã? Até sistemas caóticos são determinísticos, pois seguem regras fixas, mas mesmo eles exibem uma sensível dependência das condições iniciais. E é exatamente nesse ponto que uma minúscula variação pode ter vasto impacto com o passar do tempo, conduzindo a resultados imprevisíveis, drasticamente diferentes do esperado. Veja o caso dos gêmeos. Compartilhando de tão semelhante composição genética, mesmo os univitelinos nunca se tornarão pessoas idênticas nem parecidas no modo de ser, agir e decidir.
“Somos máquinas biológicas. A diferença para a IA é que nos revelamos multifacetados, tendo a consciência de quais são nossos botões e onde estão eles”
O que constatou em seus estudos sobre gêmeos? Está claro que, desde o nível celular mais primitivo, notam-se distinções entre eles que só se aprofundam ao longo do tempo. Cada um terá sua trajetória e sofrerá influências de suas próprias experiências — algo que os marcará de modo decisivo. A questão é que nada disso é visível, daí ser impossível traçar cenários com precisão matemática. O que dá para depreender são tendências.
Compreender a tomada de decisões tal como o senhor define traz algum benefício? Acho que, a partir do momento em que entendemos as escolhas de cada um como uma expressão de sua natureza, há mais empatia e menos julgamento. O ódio é uma face sombria da espécie e deveria ser expurgado. Quem sabe a compreensão de que os indivíduos são diversos por definição, desde o princípio da vida, não contribui para um ambiente de maior tolerância, algo de que tanto necessitamos nos dias de hoje.
Como lidar com criminosos dentro dessa lógica determinista, segundo a qual eles estariam “programados” para infringir a lei? Claro que precisa haver punição, mas o modelo em vigor em países como os Estados Unidos, onde trabalho junto a defensores públicos, deveria ser repensado à luz desses estudos. Não é para atenuar a transgressão praticada pelo bandido, mas entender que ele só vai evoluir quando exposto a um ambiente de convívio com os outros, capaz de estimular mudanças positivas. Na Noruega, por exemplo, as prisões são guiadas pelo foco na reabilitação, à base de muita atividade e educação. É verdade que o investimento nessa direção é alto, mas há registros de queda nas taxas de homicídio e na reincidência de crimes variados. Tudo indica que vale a pena.
O determinismo também se aplica ao amor? Os poetas que me perdoem, mas existe toda uma estrutura regida pela biologia que faz com que um indivíduo se apaixone pelo outro. A escolha por um parceiro também tem a ver com genética — até o cheiro de cada um influencia no acasalamento — e com o ambiente. Viver em um contexto parecido funciona como potente fator de aproximação.
Às vezes, parece que o senhor acredita em destino. É isso mesmo? De nenhuma forma. O determinismo científico a que me refiro é diferente do predeterminismo protestante do século XVII. Este é fatalista e diz respeito à ideia de previsão do que vai acontecer, portanto ao destino. Mesmo com as limitações humanas, nós, cientistas, não achamos que o futuro seja imutável. Temos que aprender a tirar o melhor proveito das circunstâncias.
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Estamos em uma época onde todos tem opinião sobre tudo e todos… E as pessoas recebem opiniões de todos os lados. O tempo todo… até as rede...