Inspirar e Expirar: Controlando Estados Emocionais e Mentais
Introdução
Em 15 de setembro de 2006, ao participar de um Simpósio sobre Transtornos de Ansiedade (1), o Dr. Alfredo Simonetti do Ambulatório de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria da USP disse, em sua conferência, que uma pessoa ansiosa e tensa, ou tendo episódios paroxísticos de ansiedade, pânicos, precisa apreender a relaxar. Isto é, passar por um treinamento para aprender a relaxar. Ao fim do simpósio, uma mesa redonda, formada pela equipe técnica interdisciplinar da recepção do serviço, ensinou como receber um paciente ansioso, ou em pânico, ensinado técnicas de respiração para acalmá-lo.
Disseram que a respiração curta, alta, peitoral e em maior freqüência acumula gás carbônico e diminui oxigenação, pode levar a ansiedade, ou até desencadear episódios de pânico. Por outro lado, a respiração profunda, baixa, abdominal e em menor freqüência, diminui concentração de gás carbônico e aumenta a concentração de oxigênio, pode levar a diminuir a ansiedade e sair do episódio de pânico. A equipe multidisciplinar deu exemplos ao vivo desses dois tipos de respiração. Aconselhou a orientar pacientes ansiosos a inspirar contando até 3 e expirar contando até 6 até esvaziar todo o conteúdo de ar dos pulmões. Reiniciar o ciclo de inspiração em 3 e expiração em 6, várias vezes até se acalmar.
No tratamento de paciente com pânico existe a terapia cognitiva e comportamental, onde se fazem sessões de inspiração e expiração, e trabalham-se os conteúdos mentais associados ao transtorno até que o paciente aprenda a se controlar pela respiração. Se acalme e evite futuros episódios de pânico (2).
Explicação Psico e Neurofisiológica
O Dr. James H. Austin (3) da Universidade do Colorado, médico neurologista, neurocientista e praticante de meditação, levanta a seguinte questão sobre a respiração e o controle emocional: Pode respirar ajudar a descobrir nossa capacidade de dirigir nossa experiência emocional e mental? Você pode pensar que não. Afinal respirar é automático. Nós constantemente inspiramos e expiramos. Por quê? Respirar é um excelente exemplo da relação estreita entre mente, cérebro e corpo. A maneira como respiramos nós dá um índice sensível e confiável de como nossa vida emocional regula ritmos de nosso cérebro inferior que ativa as partes superiores. As partes inferiores do cérebro são formadas de medula oblonga, bulbo, ponte e diencéfalo. A medula e bulbo são as partes mais inferiores. Aqui se mantem a regulação, quando os níveis de oxigênio baixam e gás carbônico sobem, nos levam a respirar mais. Da medula para baixo descem impulsos, através da coluna dorsal e, para fora, nos nervos periféricos que contraem os músculos da caixa torácica e diafragma.
O peito expande e diafragma desce. A barriga vai para frente. Tudo isso se traduz numa inspiração. Assim, como os pulmões expandem, seus receptores de alongamento se tornam tensos. Isto manda sinais para cima, pelo nervo vago, para informar a base do cérebro. Lá, eles geram uma inibição curta e repentina que para a inspiração. Finalmente, assim que começamos a respirar para fora, muita da expiração procede passivamente, dirigida pela elasticidade do peito e abdômen.
Um outro fator diminui a inspiração: mensagens proprioceptivas que retornam dos músculos abdominais baixos. Nós não estamos conscientes da maioria desses impulsos, que ainda ascendem, também, para inibir lá no alto da medula, na base do cérebro, e desligar a inspiração.
Note o que acontece quando fazemos exercícios respiratórios. A pessoa exercitando esses presta mais atenção, conscientemente, neste sobe e desce dos movimentos abdominais. Pessoas jogando tênis, ou lutando artes marciais, expiram e gritam durantes movimentos mais bruscos. Mas, cantar tende a desprezá-los. Nós esquecemos, quando cantamos, a respiração prolongada, que precisa da expiração e da prática de exercícios respiratórios. Cantando e outras técnicas respiratórias prolongam a expiração e criam pressões levemente maiores dentro dos pulmões e abdomens. Desta maneira tais práticas podem aumentar mais o tônus inibitório dos nervos vagos, e assim de modo sutil, diminuem a vontade respirar na base do cérebro.
Usando a respiração como modelo, o Dr. James H. Austin, pesquisador de animais em laboratório, examina mudanças na respiração, que ilustra três maneiras básicas nas quais as funções fisiológicas locais podem ser mudadas no cérebro. Em termos mais simples, estas envolvem (1) excitação ou estimulação, (2), inibição, esfriamento, ou dano, (3) liberação de uma excitação após inibição anterior. Isto significa que muito pequenas áreas na medula alta, servem para funções específicas (3).
Em animais, um cientista experimentador, pode causar inspirações curtas pelo resfriamento da parte ventral superior da medula. A inibição pelo resfriamento provoca redução das funções locais. Pelo contrário, a expiração é prolongada pelo resfriamento da parte inferior ventral da medula oblonga. Inibindo esta região inferior não muda a profundidade da inspiração, nem suspende a respiração.
Neurologistas, geralmente, encontram acidentes vasculares na parte baixa da ponte, em que o paciente para de respirar muitos segundos a cada respirada.
Dr. Austin observou que a atividade elétrica da amídala e do hipocampo, que estão envolvidas com emoções e memórias de emoções, respectivamente, aumentam quando os gatos inspiram. E quando expiram, essas descargas elétricas nestas duas estruturas límbicas diminuem. Por que elas seguiam esse ritmo regular? pergunta o cientista. Porque estavam os disparos rítmicos nos sítios altos no sistema límbico (na amídala e no hipocampo) sincronizados com aqueles de outros grupos celulares localizados na parte mais baixa que controla a respiração? “Expirar, respirar para fora, estava acalmando o cérebro” O mesmo fenômeno já foi observado em pesquisas com humanos (3).
Auto-Controle Emocional e Cognitivo
Segundo esse neurocientista, Dr. Austin, praticante de meditação, os monges budistas, sentados e meditando, usam técnicas respiratórias para acalmar e controlar as emoções. Ao sentar e meditar a freqüência respiratória de 20-16 cai para menos de 12 ou até 7 vezes por minuto. O tempo de inspiração diminui a um terço do ciclo respiratório, e o tempo de expiração aumenta para dois terços do mesmo. Isso pode ser feito de maneira natural, ou por esforços introspectivos, alterando os estados emocionais e mentais.
De acordo com pesquisa citada pelo neurocientista meditador, os estados de tensão aumentam a respiração peitoral, e os estados de relaxamento favorecem a respiração abdominal. A primeira é curta e a segunda é prolongada. A primeira é superficial e a segunda é profunda. Parando para meditar, e prestar atenção na respiração, faz com que o praticante, parado, diminua o consumo de oxigênio. Logo, respira-se com menor freqüência. Aumentam a concentração de oxigênio e a mensagem para base do cérebro é para diminuir, e para o alto do cérebro no sistema límbico é para acalmar.
Em resumo, toda vez que se respira mais quieto e com fase de expiração prolongada, provavelmente, aquieta-se as atividades de disparos das células nervosas da base do cérebro e do sistema límbico um pouco mais acima. Segundo outro médico, este endocrinologista, Dr. Deepak Chopra, técnicas de posturas de relaxamentos e alongamentos, junto com as da meditação e respiração yogues, servem para acalmar a mente agitada (4).
Possível Uso Terapêutico
Algumas referências sobre transtornos de ansiedade e de pânico (5) dissem que a terapia cognitiva e comportamental, usando técnicas de respiração e relaxamento, levam mais tempo para controlar o pânico do que a medicação, Fluoxetina e Clonazepan; mas quando os pacientes conseguem se controlar, somente com essas técnicas, os resultados são mais duradouros e com menos recaídas. Enquanto que a medicação é mais eficiente em tirar o paciente do pânico em 15 a 20 dias; esta, quando é abandonada, leva a recaídas rápidas e, às vezes, mais graves. Porque a técnica de respiração demora mais para funcionar, mas é mais duradoura quando funciona?
Provavelmente, porque é um aprendizado, treinamento de conscientização, que uma vez dando certo, o paciente sente no controle consciente de suas emoções. Controle consciente de emoções que é o objetivo da filosofia da Yoga e da Meditação. Segundo os psicólogos Maren Westphal e George A. Bonano da Universidade de Columbia, a Yoga e a Meditação são recursos de aprendizagem de habilidades de auto-regular as emoções. Quanto mais pratica, mais apreende as habilidades de acalmar-se e controlar as emoções no dia-a-dia (6). O instrutor de Yoga Leandro Percário, formado pela Associação Nacional de Yoga Integral, explica que o ser humano respira em média 16 vezes por minuto. Mais do que isso a pessoa está ansiosa. Para acalmar o estado emocional e mental é só soltar o ar bem devagar até chegar a 8 respirações por minuto. É uma tarefa que não se aprende de um dia para o outro. É preciso treino e paciência (7).
A máxima dos praticantes de meditação zen budista que diz: “O que passou, passou; o que virá, virá; o importante é o aqui e agora do presente” A Depressão tem como uma das características principais as ruminações do passado e, a Ansiedade, as preocupações com o futuro. Ao concentrar-se na respiração, e no aqui e no agora, podem-se pensar na Yoga e Meditação como terapias para estados depressivo-ansiosos mistos. Em recente livro de Gordon Parker, pesquisador de depressões australiano, ele refere que os casos de depressões mistas moderadas a leves, associadas a transtornos de personalidade e eventos estressantes de vida, podem benificiar-se com programas de treinamento de respiração e relaxamento da Yoga e Meditação (8).
Conclusão
Pelas experiências em animais pelo Dr. Austin (3), mais as pesquisas com Neuroimagem Funcional feitas pelo Dr. Richard Davidson (9) em humanos praticantes em recente artigo do Dr. Ulrich Kraft (10), médico alemão divulgador de neurociência, tudo leva crer que a respiração devagar e prolongada, principalmente na expiração, acalma inibindo a amídala, que inibe e desativa o lobo frontal direito, sede das ansiedades antecipatórias.
Concomitamente há também mais ativação do lobo frontal esquerdo. Por outro lado, a respiração curta, mais rápida e freqüente, estimula a amídala que ressona no lobo frontal direito e hipocampo, trazendo ansiedades antecipatórias e ruminações do passado associadas a sentimentos negativos. A respiração com expiração longa, mais profunda e devagar, inibe a amídala trazendo sensações de bem estar e alívio, associados a sentimentos mais positivos, após ativar mais o lobo frontal esquerdo. Logo, meditar, relaxar e respirar pode mudar a maneira de funcionar do cérebro e regular seus estados emocionais e mentais.
Dr. Carlos Manuel Cristóvão
Médico e Psiquiatra
CRM 88611
Bibliografia
1- IV Encontro de Saúde Mental da Associação Hospitalar Thereza Perlati de Jaú-SP, Tema: Transtornos de Ansiedade, em 15 de setembro de 2006.
2- Dattílio, Frank M. e Kendal, Philip C., Transtorno de Pânico em Dattílio, Frank M., Freeman, Arthur & Cols., Estratégias Cognitivo-comportamentais de Intevervenção em Situações de Crise, Artmed editora, Porto Alegre, RS, Brasil, 2004.
3- Austin, James H., Zen and the Brain. A Bradford Book, MIT Press, Cambridge, USA, 1999.
4- Chopra, Deepak, M.D. e Simon, David, As Sete Leis Espirituais do Yoga, Rocco, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2006.
5- Hetem, Luiz Alberto B. e Graef, Frederico G. Graef, Transtornos de Ansiedade, Atheneu, São Paulo, SP, Brasil, 2004.
6- Westphal, Maren and Bonano, George A., Emotion Self-regulation in Beauregard, Mario, Conciousness, Emotional Self-regulation and The Brain, John Benjamins, Amsterdam, Netherlands, 2004, pgs 1-33.
7- Diório, Eduardo, Yoga Equilíbrio para o Corpo e o Espírito, Jornal da Cidade, Suplemento Saúde, Bauru-SP, Brasil, Domingo, 16 de dezembro de 2007, pg. 2.
8- Parker, Gordon and Manicavasagar, Vijaya, Modelling and Managing the Depressive Disorders: A Clinical Guide, Cambridge University Press, New York, USA, 2005.
9- Davidson, Richards and Cols, Handbook of Affective Sciences, Oxford University Press, New York, USA, 2003.
10- Kraft, Ulrich, Iluminação Neuronal, em Viver: Mente e Cérebro, Scientific American, ano XIV, Nº 154, novembro de 2005, pgs. 58-63.
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