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Pergunta: então, livre-arbítrio EXISTE?

O livre arbítrio pode ser definido por três condições, segundo o Psiquiatra e Neurocientista Prof. Dr. Henrik Walter:


A primeira é a “capacidade de fazer o contrário”. Este é um conceito intuitivo: para ser livre, é preciso ter pelo menos duas alternativas ou cursos de ação entre os quais escolher. Se alguém tem um espasmo involuntário da boca, por exemplo, não está em posição de escolher se quer torcer a boca ou não. 


A segunda condição é o “controle sobre as próprias escolhas”. A pessoa que age deve ser a mesma que decide o que fazer. Para ser concedido o livre arbítrio, é preciso ser autor de suas escolhas, sem a interferência de pessoas e de mecanismos fora de seu alcance. Isso é o que chamamos de agenciamento, ou seja, ser e sentir-se o “dono” de suas decisões e ações. 


A terceira condição é a “responsividade às razões”: uma decisão não pode ser livre se for o efeito de uma escolha aleatória, mas deve ser motivada racionalmente. Se eu rolar um dado para decidir com quem me casar, minha escolha não pode ser considerada livre, mesmo que eu escolha livremente dizer “sim”. Pelo contrário, se eu escolher me casar com uma pessoa específica por suas ideias e meu profundo amor por ela, minha decisão será livre.


Então, mesmo que, várias vezes ao dia, nós ajamos por "impulso", ou contra os nossos interesses, ou mesmo sem ter "plena consciência" do que estamos fazendo, ainda assim temos acesso a condutas e escolhas que são NOSSAS!


Tendo isso em mente, pense nos estudos mostram que comprovam que começamos a "preparar" movimentos até um segundo antes de sentirmos "vontade" de fazer aquele movimento; Experimentos que mostram que a atividade do cérebro prediz se escolheremos A ou B a seguir antes de "sabermos" (conscientemente) o que escolher; uma decisão já pode ter sido feita pelo cérebro até 7 segundos antes de tomarmos ciência do que vamos decidir.

A Pergunta que fica é: Então, livre-arbítrio não existe, certo?

Errado.

Errado, em ao menos três níveis. 

Primeiro: ao contrário do que dizem os livros didáticos, o sistema nervoso NÃO serve para "detectar estímulos e organizar respostas a eles". Fosse assim e nós viveríamos presos ao presente, condenados a apenas reagir aos acontecimentos. Nessas condições, até andar seria um problema - pois, para nos mantermos em pé, é preciso antecipar a queda iminente e mover as pernas sempre na expectativa do desastre. Não somos, portanto, máquinas de reagir-a-estímulos: nós nos adiantamos a eles, e fazemos isso porque o cérebro cria modelos internos do mundo, prevê acontecimentos, e toma decisões com base em suas expectativas.


Segundo: não precisamos esperar que estímulos aconteçam. Somos capazes de iniciar comportamentos por conta própria, com base em nossas experiências anteriores e expectativas para o futuro. Só assim é possível entender como decidimos começar a estudar hoje para uma prova amanhã, ou levantar da cama com desejo de assistir a um filme específico, ler aquele livro que um dia você viu na estante, ou ir para a rua correr ao sol.

Terceiro: mesmo que tenhamos decidido fazer, comprar ou falar, é sempre possível voltar atrás, até o último instante - desde que você tome ciência do que está prestes a fazer. Seu cérebro prepara suas ações com segundos de antecedência, mas ao menos meio segundo antes de passar à ação é possível tomar ciência do que se está prestes a fazer - e isso é tempo suficiente para então decidir, se for o caso, NÃO fazer.

E, por último, a razão maior para dizer que livre-arbítrio, sim, existe - e que pode ser ao mesmo tempo a constatação mais difícil e também a mais simples de todas: no que tange às suas decisões, você É o seu cérebro. Se seu cérebro decidiu agora mas só tomará ciência disso daqui a 7 segundos, VOCÊ decidiu agora e só tomará ciência disso daqui a 7 segundos...


Você É o seu cérebro.






Livremente baseado no texto de Suzana Herculano-Houzel em "A neurocientista de plantão" e Inspirado em ensaio do biólogo alemão Martin Heisenberg, na revista Nature de 4 de maio, em que ele sustenta que não é preciso termos consciência de nossas decisões para sermos considerados seres dotados de livre-arbítrio; o que importa é que nossas ações são auto-geradas)

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