Publicado originalmente na Zero Hora de Sábado último por Dr. José J. Camargo.
Quando a vida não termina Treinados a lutar pela vida, parece que fomos perdendo a naturalidade do convívio com a morte, a ponto de prorrogá-la sem sentido, e às vezes, claramente, sem compaixão. As escolas médicas nos ensinam a usar toda a tecnologia moderna para sustentar um fiapo miserável de sobrevivência, mesmo que depois desse embate não haja no horizonte nenhum resquício de vida digna.
E os leigos, impressionados com os relatos dos milagres da sofisticada terapia intensiva, pressionam os médicos inexperientes a transferiram os seus familiares para a UTI como se esse fosse um lugar para se morrer. E mais do que isso, consideram que a morte fora dela, é sinônimo de subatendimento médico, com direito à culpa no futuro.
No desespero pela iminência da perda, ignoram que muitas vezes a supressão de tratamentos fúteis, a chamada ortotanásia, é apenas um gesto final de profunda generosidade. A disciplina de cuidados paliativos, ainda carente na maioria das nossas faculdades de Medicina, deve nos fazer compreender os limites entre o que é possível e o que é razoável.
Muitas vezes, diante do sofrimento sem sentido, simplesmente não sabemos o que fazer. Ouvir a família, nesses casos, pode ser a melhor solução. O Armando agonizava de sua fibrose pulmonar, e anunciei que pretendíamos sedá-lo para que não sofresse nos instantes finais. Mariana, sua companheira de 55 anos, me pediu que não, porque eles tinham muito que conversar.
Quando deixei o quarto, eles estavam de mãos dadas e ele me sorriu agradecido. Voltei ao amanhecer, e ele acabara de morrer. Ainda segurando aquela mão enrugada, com uma serenidade pungente, ela me agradeceu:
– Ele me disse coisas tão lindas! Obrigado, doutor, por ter nos dado a segunda melhor noite das nossas vidas! E a melhor parte dele vai continuar viva em mim.
Ficamos abraçados por um tempo e comprimido contra o peito era possível sentir a delicadeza do palpitar daquele coração, de paredes tão finas, que quase permitia ouvir do outro lado. Compungido, saí para o corredor, arrasado pela perda, mas com um pouco de inveja de quem se fizera amar tanto, e por tanto tempo.
E os leigos, impressionados com os relatos dos milagres da sofisticada terapia intensiva, pressionam os médicos inexperientes a transferiram os seus familiares para a UTI como se esse fosse um lugar para se morrer. E mais do que isso, consideram que a morte fora dela, é sinônimo de subatendimento médico, com direito à culpa no futuro.
No desespero pela iminência da perda, ignoram que muitas vezes a supressão de tratamentos fúteis, a chamada ortotanásia, é apenas um gesto final de profunda generosidade. A disciplina de cuidados paliativos, ainda carente na maioria das nossas faculdades de Medicina, deve nos fazer compreender os limites entre o que é possível e o que é razoável.
Muitas vezes, diante do sofrimento sem sentido, simplesmente não sabemos o que fazer. Ouvir a família, nesses casos, pode ser a melhor solução. O Armando agonizava de sua fibrose pulmonar, e anunciei que pretendíamos sedá-lo para que não sofresse nos instantes finais. Mariana, sua companheira de 55 anos, me pediu que não, porque eles tinham muito que conversar.
Quando deixei o quarto, eles estavam de mãos dadas e ele me sorriu agradecido. Voltei ao amanhecer, e ele acabara de morrer. Ainda segurando aquela mão enrugada, com uma serenidade pungente, ela me agradeceu:
– Ele me disse coisas tão lindas! Obrigado, doutor, por ter nos dado a segunda melhor noite das nossas vidas! E a melhor parte dele vai continuar viva em mim.
Ficamos abraçados por um tempo e comprimido contra o peito era possível sentir a delicadeza do palpitar daquele coração, de paredes tão finas, que quase permitia ouvir do outro lado. Compungido, saí para o corredor, arrasado pela perda, mas com um pouco de inveja de quem se fizera amar tanto, e por tanto tempo.
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