Retirado do http://nalanda.org.br “O Centro Dentro de Nós”
Autor: Rev. Gyomay Kubose
Tradução: Ricardo Sasaki
“Sensei Gyomay Masao Kubose foi discípulo do Rev.Haya Akegarasu e fundou o Buddhist Temple of Chicago, sendo seu líder espiritual até sua morte, em 29 de março de 2000, com 94 anos de idade. Foi citado muitas vezes por sua obra no âmbito da comunidade buddhista e das relações comunitárias e em 1970, recebeu o World Buddhist Mission Cultural Award. Durante toda sua vida o Rev. Kubose enfatizou e ensinou a todos o Buddha-Dharma não-sectário.
PREFÁCIO À EDIÇÃO
BRASILEIRA
As condições kármicas que resultaram nesta Edição Brasileira do livro “The
Center Within” do Reverendo Gyomay Kubose, são como a miríade de interconexões
da rede de Indra. Anos atrás, durante sua estadia em Chicago, encontramos
Ricardo Sasaki, que nos falou do seu sonho de traduzir “The Center Within”,
ocasião em que oferecemos a ele nossa aprovação e encorajamento Vendo pronta
esta edição, nós estamos gratos e o congratulamos por sua perseverança e pelo
fato de haver realizado aquele seu sonho. Graças a esforços como o de Sasaki, a
abordagem prática de meu pai quanto ao Buddhismo torna-se parte de uma rede de
Dharma que se expande neste novo Milênio.
Rev. Koyo S. Kubose
PREFÁCIO DO
TRADUTOR
Belo Horizonte, 2008
Em 1987 tive o prazer de conhecer o Reverendo Gyomay Kubose em seu templo
buddhista em Chicago, EUA. Desde o primeiro momento, no afetuoso abraço daquele
pequeno homem, pude perceber a grandeza de seu caráter e a natureza singela
daquele buddhista americano descendente de japoneses. MasaoKubose nasceu em
1905, em São Francisco, Califórnia, mas seus primeiros anos foram passados em
Hiroshima, no Japão. Ele voltou para os EUA em 1922, formando-se, mais tarde, em
Filosofia pela Universidade da Califórnia. Quando o Reverendo Haya Akegarasu, um
dos mais brilhantes religiosos do Japão, veio aos Estados Unidos no verão de
1929, MasaoKubose tinha 24 anos, e já havia lido todos os livros disponíveis do
eminente visitante. Eles viajaram juntos por 45 dias e, mais tarde, após
completar seus estudos na Universidade da Califórnia, em 1935, MasaoKubose
visitou o Reverendo Akegarasu em seu templo em Ishikawa, e com ele permaneceu
por cinco anos frutificantes.
O Reverendo Haya Akegarasu foi o mais brilhante discípulo do renomado
Reverendo Manshi Kiyozawa. Quando, em 1954, o Reverendo Akegarasu estava em seu
leito de morte,GyomayKubose foi visitá-lo. Akegarasu olhou para ele e disse:
“Quando olho para trás, parece-me que vim a este mundo para encontrá-lo”. Ambos
se abraçaram e choraram.
“O Centro Dentro de Nós” é repleto de passagens que deixam marcas
inesquecíveis; um fruto da experiência real de quem vive o que diz. Desde a
primeira vez que o li, desfrutando ainda da graça de conviver com oautor em seu
templo, este livro tem sido uma fonte de inspiração e um remédio constante a
lembrar-me de que o Caminho é aquele da simplicidade. Desejar que ele fosse
traduzido para o português era um impulso irresistível, e agora os leitores
brasileiros deste livro poderão também compartilhar das palavras de sabedoria do
velho mestre.
Uma de suas ênfases enquanto ensinava é que se deveria estar totalmente
naquilo que se faz. Estar no presente, aqui e agora. Gyomay Kubose, ele mesmo,
foi o perfeito exemplo disso em sua vida. Um homem inteiro em uma vida de
dicotomias: alguém de sangue japonês, mas que nasceu nos EUA; sua combinação dos
ensinamentos diretos do Zen com o afeto compassivo da Terra Pura. O Zazen e o
Nembutsu numa única pessoa revelam já a natureza de seu ensinamento: uma suave
junção de estilos, um compromisso pelo respeito a tudo e a todos.
Ricardo Sasaki (Shaku Ryushin)
Centro Buddhista Nalanda
Belo Horizonte, 2008
Centro Buddhista Nalanda
Belo Horizonte, 2008
O BUDDHISMO É A VIDA DE TODOS OS
DIAS (um trecho do livro)
Quando Nansen, um professor, foi
perguntado: “O que é o Buddhismo?”, ele respondeu: “A vida de todos os dias”.
Essa é uma das muitas formas de indicar a essência do Buddhismo. No Buddhismo,
falamos sobre o “caminho” ou a “via”. Em chinês é chamado “Tao”. Em japonês,
“Dô”. “Dô” é a via ou o modo como vivemos todos os dias. O que é esta via? Por
que tipo de caminho você anda? Temos muitas pretensões e representamos as coisas
como queremos que elas sejam. Não vemos as coisas como elas são. Não entendemos
a vida “tal como ela é”. O Buddhismo é a forma mais natural de viver, onde cada
pequena coisa que fazemos é o Caminho.
Sem pretensões ou artificialidade, cada
caminho é unicamente do próprio indivíduo. Cada caminho é diferente, mas, ainda
assim, há o Grande Caminho em que todos andam. É a mesma via, mas diferente para
cada indivíduo. Pode ser difícil compreender que o Caminho Universal é o nosso
próprio caminho. Esta é a diferença entre o caminho verdadeiro e o caminho não
verdadeiro.
Assim como a liberdade é diferente da
falta de lei; a liberdade sempre caminha com a lei. A liberdade existe quando a
lei é vivida. O que isso significa é que se deve encontrar o caminho
profundamente dentro de si. Assim, o caminho não existe “lá fora”. Fora e dentro
se tornam idênticos. Universal e particular se tornam um. Você vive sua própria
vida e não há um padrão pré-estabelecido. Ainda assim, seu padrão único é
formado da mesma forma como aquele do universo. Este é o caminho da vida. É uma
flor desabrochando, um vento soprando. Você vive; eu vivo.
Quando você vive o Caminho Universal,
você vê a vida se expressando em todos os lugares. É uma vida tão fabulosa e
nobre que você não pode deixar de se sentir inspirado. A vida é arte quando
vivida dessa forma. Arte significa que ela é absoluta. Há criatividade na vida;
a imitação não tem valor. A arte deve ser original e única. A arte do haiku, a
poesia japonesa, é a vida buddhista expressa na forma poética. Cada momento da
vida é um poema em si mesmo. Quando cada ação é uma expressão da vida em si
mesma, há beleza e realização. Isso é a via universal. Esse é o caminho que
Nansen indicou quando disse: “O Buddhismo é a vida de todos os
dias”.
LAVE OS PRATOS (um trecho do
livro)
Um noviço aproximou-se de seu mestre e
disse: “Por favor, ensina-me Buddhismo”. O mestre perguntou: “Você já comeu?” O
noviço respondeu: “Sim”. O mestre disse: “Então, lave os
pratos”.
Esse diálogo é famoso. Após comer, é
natural lavar os pratos e limpar o resto. Este modo natural é o modo buddhista.
Quando a ajuda é necessária, vá e ajude naturalmente – sem nenhuma sensação de
obrigação ou dever.
Nuvens aparecem no céu de acordo com
causas e condições. Elas se movem como devem se mover. A água flui de um plano
superior para um inferior. O homem é parte da natureza. Por que não vivemos
naturalmente? Quando nosso ego aparece, há tanta artificialidade e pretensão!
Sim, a vida algumas vezes é dura – muito dura. Mas a vida deve ser vivida. Não
podemos escapar. Ficamos doentes. Sem ninguém para ajudar. É a vida. Encare a
realidade de frente e não seja derrotado. Não seja arrogante. Quando for
difícil, agüente. Ajude os outros e seja ajudado. Esta é a forma
natural.
Quando fazemos coisas, por menores que
sejam, que possamos fazê-las cem por cento. Não cometemos muitos enganos nas
coisas grandes da vida; cometemos nas coisas pequenas. A vida, no final das
contas, é composta de coisas pequenas colocadas juntas. Cada ação deve ser feita
cem por cento, de modo que, no final do dia, não haja arrependimento. Uma vida
buddhista é uma vida sem arrependimentos.
Lavar seus pratos após ter comido é algo
comum, uma coisa natural. O Buddhismo não é algo especial. Viva como o vento;
viva como a água que flui. Faça tudo sincera e completamente – sua vida se
tornará perfeita. Perfeita sem comparações, pois não há algo como um critério
geral. Cada um vive sua verdadeira vida. Isto é o que o mestre queria dizer
quando falou: “Depois de comer, lave os pratos”.
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