Segurando o Viver com as Mãos ~ SEGUNDA-FEIRA, 19 DE MARÇO DE 2012
O que seria a Vida? Qual o estilo de vida mais correto? O que define nosso lugar no mundo? Quais os propósitos de nossa existência? Como definir a Humanidade? Por milênios a humanidade foi assolada por dúvidas cruéis ao definir a si mesma e ao mundo que a cerca. Eu mesmo confesso que já fui assolado por perguntas como essas. Desde a minha infância questões como essas me perseguem, e me empurraram já, várias vezes, a desbravar quatro religiões, duas visões de mundo céticas, três ideologias sócio-políticas e estudar pelo menos quatro ciências regularmente. Porém, nem mesmo tanto trajeto cumprido, tanto conhecimento adquirido e tanto caminho andado me ajudaram a responder essas perguntas. Na verdade, cada religião, cada caminho cético, cada ideologia e cada ciência ajudaram apenas a potencializar as perguntas nas quais mergulhei.
Desde os sete anos algumas dessas perguntas me acompanham. Atravessei uma adolescência conturbada em que o sofrimento da idade associada ao da fragmentação familiar, do bullying escolar, do desemprego e das cobranças escolares me indicou um caminho, mas todos os trajetos percorridos apenas aceleraram a criação de perguntas cada vez mais complexas. Fui por anos e anos acompanhado pelas questões acerca da vida, da existência, do ser o que sou enquanto todo o resto era o que era. Apesar de ter passado um tempo como Católico, outro como Ateu, outro como Taoísta, outro como Ocultista, outro como Protestante e outro como Agnóstico (hoje sou Budista), não fui de me preocupar com o que viria depois da morte, com o que viria antes do nascimento, e tampouco me interessava em saber se existia ou não um Deus. Minha preocupação era apenas a vida, a existência e o fato de eu ser o que sou, ou seja, era a Vida, o Ser e a Consciência.
O problema é que eu queria resolver a questão sobre a vida. Mas, qual questão? Não fiz a pergunta. Queria resolver o problema da vida sem criar o problema. O mesmo se disse em relação ao Ser e à Consciência. Como eu responderia uma pergunta que não foi feita? Foi então que resolvi começar a fazer perguntas. E nas perguntas comecei a esbarrar em vários problemas: como definir o que é Vida, o Ser e a Consciência? Como estabelecer as relações entre Vida, Ser e Consciência? Como evidenciar na prática a Vida, o Ser e a Consciência? Que conhecimentos me elucidam mais precisamente sobre a Vida, o Ser e a Consciência? Confesso que, ao me deparar com essas perguntas, percebi o abismo em que entrei. Uma pergunta, para ser respondida, exigia primeiro a resposta de uma outra pergunta, e essa exigia outra. Enfim, me vi preso em uma rede tão complexa de conceitos, conhecimentos e caminhos que simplesmente estacionei, não conseguia mais mover meu pensamento sem que, com isso, eu rasgasse, quebrasse ou desfizesse laços entre as perguntas. Qualquer movimento danificava a rede complexa que se formou.
Em um ímpeto de sanidade resolvi não apenas me mover. Resolvi dançar. Destruí toda a complexidade que se formou e deixei que ela se fizesse por si mesma, e montei um blogue. Como seria uma tarefa árdua compreender o que é a Vida, o Ser e a Consciência, simplesmente deixei de buscar as respostas, pois elas eu já tinha, e me concentrei em realizar as perguntas certas. Percebi que a Filosofia tinha lacunas, que a ciência tinha lacunas, que a religião tinha lacunas, que as artes tinham lacunas. Porém, eram como peças de quebra-cabeça que só se encaixavam em pequenas partes, e entravam em conflito em outras partes. Pareciam vir de quebra-cabeças diferentes e incompletos. Elucidavam acerca dos mesmos problemas, mas suas respostas, seus métodos e sua base eram completamente distintas umas das outras. Comecei a prestar atenção nessas lacunas, e percebi, para meu terror, que elas não coincidiam, que mesmo algumas sendo supridas pelas demais peças, o resultado final não era a diminuição de lacunas, mas o aumento delas. Toda tentativa de fechar as lacunas da filosofia com a ciência, ou da ciência com a religião, tinha uma estranha propriedade de gerar o dobro de lacunas. Mais uma vez, precisei dançar para me libertar da nova rede.
Como eu disse, a resposta eu já tinha, mas as perguntas estavam totalmente erradas. Eu precisava da pergunta para ligar minha percepção à resposta. Foi então que olhei pelas trevas e vi que meus olhos é que formavam as imagens, as coisas nunca estavam de fato lá onde estavam. Percebi que a pergunta estava sendo feita de forma errada porque já deduzia a resposta por meio dela. Foi quando decidi abrir mão da resposta, e me concentrar apenas em perguntar.
De certa maneira, me senti mais livre. Porém, outro perigo me aguardava. Comecei a recriar a rede, e as respostas formavam fios mais sólidos, até o momento em que, mais uma vez, qualquer tentativa de movimento desfaria toda a rede conceitual mais uma vez. Vi que toda tentativa de lidar com as perguntas e as respostas seria, desde já, perda de tempo. Discorrer sobre perguntas e respostas nunca responderia às perguntas, e nunca criaria perguntas satisfatórias para as respostas. As respostas sempre estiveram lá, e as perguntas também. Vi que eu estava negligenciando um aspecto fundamental da Vida, do Ser e da Consciência.
Para entender a Vida, eu estava pensando em termos substantivos, olhando-a como um objeto estático, imóvel, sólido. Via a Vida como um conceito, e definia a Vida como um objeto (lançado para fora de mim). A coisa se clarificou quando mudei a estrutura da palavra, e a Vida deixou de ser Vida, e transformou-se em Viver / Vivendo. Não era o Vivi, não era o Viverei, não era o Viveria nem o Vivia, nem era a Vida, e muito menos o Vital, o Vívidoou o Vivenciado. Abandonei toda concepção de Início, Meio e Fim para o Viver. Desmontei toda e qualquer forma de pensar, de discorrer, de elucidar sobre o Viver. Era, o Viver / Vivendo puro e simples. Importava somente o queVivo, aqui e agora, neste momento, na atual circunstância.
O mesmo me tirou das amarras do Ser. Para entender a Ser, eu estava pensando em termos metafísicos, olhando-a como um princípio absoluto e imutável, uno e transcendente. Via o Ser como um conceito, e definia o Ser como um princípio (causa de todas as coisas). A coisa se clarificou quando percebi que o Ser era Absoluto, mudei a estrutura da palavra, e o Ser deixou de ser o Ser, e transformou-se em Sendo. Não era o Foi, não era oSerá, não era o Seria nem o Era, nem era o Ser, e muito menos o Ente, a Essência ou a Existência. Abandonei toda concepção de dualidade, de unidade, de existência ou inexistência para o Sendo. Desmontei toda e qualquer forma de pensar, de discorrer, de elucidar sobre o Sendo. Era, o Sendo puro e simples. Importava somente que as coisas são o que são aqui e agora, e que o Sendo vive em constante movimento e, ao mesmo tempo,em completa imobilidade. A lógica morre de fome ao estudar tudo o que É Sendo.
A Consciência é que me deu o maior trabalho. Não queria abrir mão do Ego, mas tive de fazê-lo. Para entender a Consciência, eu estava preso a conceitos de Eu, Sujeito, Mediação com o Mundo,Representação. Estava pensando também em termos substantivos, vendo a consciência como um sistema absoluto, interminável, fatalista ante o próprio fim. Via a Consciência como uma propriedade, e definia a Consciência como um filtro eficaz de entender as coisas. A coisa se clarificou quando mudei a estrutura da palavra, e a Consciência deixou de ser Consciência, e transformou-se em Conscientizando-se. Não era o Conscientizei-me, não era o Conscientizar-me-ei, não era o Conscientizar-me-ia nem oConscientizava-se, nem era a Consciência, e muito menos o Consciente, o Conscientizável ou o Conscientizado. Abandonei toda concepção de Eu, Mediação, Mundo, Representação. Desmontei toda e qualquer forma de pensar, de discorrer, de elucidar sobre a Consciência. Era o Conscientizando-se puro e simples. Importava somente o que Experimento, aqui e agora, neste momento, na atual circunstância.
Logo, o problema é que sempre pensei em Vida, Ser e Consciência, e nunca em Vivendo, Sendo e Conscientizando-se. Me concentrava na coisa em si que nunca vivenciarei de forma completa, e me esquecia da coisa em movimento, no aqui e agora, do meu dia-a-dia. Estava preso à definição, ao conceito, aos objetos, à coisa imóvel, à coisa como resposta, à coisa como pergunta. Estava prisioneiro dos sistemas, do passado, do futuro, da possibilidade, da perfeição / imperfeição, da dualidade, da unidade, da qualificação, da característica, do contingente. Tudo o que importava era o aqui, o agora.
Sobre a Vida, o Ser e a Consciência, não importa o que se fala, o que se pensa, o que se escreve ou o que se define. Importa tão somente Viver, Ser e Conscientizar-se. O que importa é o que se faz e o que se deixa fazer. Definir isso é como segurar o vento entre os dedos. Tão logo paremos o vento, ele deixa de ser vento.
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