Emoção em moléculas

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Podemos influenciar com o pensamento a produção de hormônios do bem-estar? 

A química da felicidade existe? 


A biopsicóloga Susan Andrews garante que sim.

por Caco de Paula



A medicina “corpo-mente” ensina que a chave está na resposta de relaxamento. O estímulo de 
determinadas emoções pode inundar as células de hormônios e neurotransmissores que permitem relaxar diante de situações estressantes. Esse é um dos pilares da biopsicologia, que alia abordagens científicas, como a psiconeuroimunologia, a conceitos orientais, como a medicina ayurvédica. “Está tudo em nossas mentes”, diz a antropóloga, doutora em psicologia e monja Susan Andrews, autora de Stress a Seu Favor (Ágora). Desde 1992 ela vive no Parque Ecológico Visão Futuro, ecovila fundada por ela em Porangaba, São Paulo.




Três pessoas ficam presas num elevador. Uma delas tem um chilique. A segunda parece sob controle, mas sofre um ataque de ansiedade logo após ser resgatada. A terceira permanece calma durante todo o episódio. A diferença no comportamento delas é a avaliação interna que fazem desse evento estressante. Segundo estudos sobre a relação entre psicologia e biologia, como os feitos pelo Instituto de Medicina para o Corpo-Mente da Universidade Harvard, o problema aí não é o estresse, mas a resposta que se dá a ele.

O que é biopsicologia, afinal?
É um termo usado por cientistas para definir o estudo científico da biologia do comportamento e processos mentais. Refere-se ao inextricável relacionamento entre psicologia e biologia, que é chamado de medicina corpo-mente, ou psiconeuroimunologia. É a confirmação do que diz a neurologista Candace Pert: cada mudança de humor é acompanhada por uma cachoeira de “moléculas de emoção” – hormônios e neurotransmissores – que flui através do corpo, afetando todas as células. Cada célula humana contém cerca de 1 milhão de receptores para receber essas substâncias bioquímicas. Assim, quando estamos tristes, nosso fígado está triste, nossa pele está triste.

Como essas moléculas nos afetam?
Praticamente tudo no corpo é regulado pelos hormônios. Eles estão entre os mais poderosos agentes biológicos, influenciando, por exemplo, nossa resposta ao estresse. Cardiologistas pensavam que as pessoas mais propensas a sofrer ataque cardíaco – as com personalidade “tipo A” – fossem apressadas, altamente competitivas e hostis. Recentemente percebeu-se que o problema não é tanto o estilo de vida acelerado ou a ambição compulsiva, mas a hostilidade. As pessoas que respondem a chefes prepotentes ou engarrafamentos no trânsito com irritabilidade – que vivem dizendo “Ai, que saco!” – secretam até 40 vezes mais cortisol das glândulas supra-renais.

Qual é o problema com o cortisol?
Em excesso, é tóxico para o organismo. Assim, pessoas do “tipo A” são cinco vezes mais propensas a sofrer doenças e morrer cedo do que as “tipo B”, que têm mais cabeça fria.

Qual a influência dos hormônios de estresse sobre os processos mentais?
A secreção excessiva de cortisol também afeta a nossa cognição – literalmente mata as células cerebrais no hipocampo, a região do cérebro responsável pela memória. É por isso que mais e mais pessoas estão perdendo a memória – esquecendo onde puseram as chaves do carro, ou fazendo listas para lembrar o que têm de fazer, e depois esquecendo onde deixaram as listas. Pesquisas na Universidade de Michigan demonstraram que o declínio da memória entre jovens de 30 a 40 anos hoje em dia é o mesmo dos idosos de 70 a 80 anos. Estamos nos tornando como o paciente que se queixou ao seu médico: “Doutor, estou perdendo minha memória!” O doutor então perguntou: “Perdendo sua memória? Há quanto tempo?” O paciente respondeu: “Há quanto tempo o quê, doutor?”

A depressão tem base biológica?
Cada emoção tem um componente biológico. Quando vemos uma pessoa deprimida numa cadeira, quase incapaz de se mover, tendemos a pensar que ela está sem energia. Pelo contrário, ela está como uma mola retesada: secretando desenfreadamente elevados níveis de cortisol, sinal de que está lutando uma exaustiva batalha mental – tudo dentro de si. Como a escola freudiana descreve, depressão é “agressão voltada para dentro”.

É possível retardar o envelhecimento com o uso de hormônios?
Estrelas de Hollywood tomam hormônios para manter a vitalidade. Mas, como endocrinologistas advertem, não existe almoço grátis. O aumento não natural de hormônios pode produzir danosos efeitos colaterais. Temos dentro de nós uma sofisticada farmacopéia. Podemos naturalmente estimular o corpo a melhorar sua produção de hormônios, sem risco para a saúde.

Como podemos produzir hormônios intencionalmente?
O objetivo da biopsicologia é otimizar a secreção hormonal. Assim como as emoções negativas são acompanhadas por uma sopa bioquímica tóxica, as positivas mobilizam um prazeroso coquetel de hormônios e neurotransmissores benéficos para a saúde. Estudos demonstram que um dos mais importantes fatores na saúde e longevidade não é exercício, alimentação ou estilo de vida, mas nossa resposta à pergunta: “Você tem alguém na sua vida que realmente o ame? E quem você realmente ame?” Aqueles que respondem “não” têm risco até cinco vezes maior de morte prematura que os que respondem “sim”. A mensagem dessas pesquisas: o amor realmente conta.

Qual molécula de emoção está ligada ao amor e à afeição?
Uma é a ocitocina, estimulada em todos durante relações afetivas e nas mulheres durante a amamentação. Ela tem poderosos efeitos antiestresse: reduz o nível de cortisol e a pressão arterial. Por isso, o apoio social é tão importante na resistência ao estresse e à saúde. Mas estamos nos tornando cada vez mais desconectados. Sofremos do que psicólogos chamam de “síndrome das metrópoles”: uma sensação de estar sozinho em meio à multidão. A tecnologia acabou com distâncias, mas foi incapaz de nos aproximar. Como diz o Dalai Lama, “compaixão e amor não são supérfluos. São fundamentais para a sobrevivência da nossa espécie”.

E como se faz isso, na prática?
Nossos corpos e mentes são como ruas de mão dupla. Podemos afetar o corpo através da mente, e vice-versa. Somente abordagens mentais ou cognitivas serão ineficazes se o sistema endócrino estiver um pandemônio. Há métodos antigos para mudar nossa bioquímica e equilibrar emoções. Fazem parte das técnicas que ensinamos no Programa Transforma do Instituto Visão Futuro, que equilibram as glândulas endócrinas e transformam sentimentos negativos – raiva, ódio, medo – em atitudes positivas, como otimismo, entusiasmo e compaixão. Inclui posturas físicas que massageiam glândulas endócrinas, visualizações, técnicas de respiração, relaxamento, meditação e nutrição. Estamos treinando facilitadores pelo Brasil para ensinar técnicas que chamamos de “Spa em Casa” – 15 minutos por dia de otimização hormonal que transforma a vida das pessoas.

Que conselho prático a biopsicologia nos dá para o cotidiano?
Faça breves pausas durante o dia para respirar lenta e profundamente através do diafragma. Faça isso também quando lidar com pessoas irritantes ou negativas e se esforce para abrir o coração e manter a mente positiva. Lembre-se: simplesmente olhar para a foto de uma pessoa que você ama ajuda a diminuir os hormônios do estresse. Coloque em prática o que um estudo feito por uma seguradora americana comprovou: quando uma mulher beija seu marido antes que ele parta para o trabalho de manhã, a expectativa de vida dele aumenta cinco anos. A dela também.

Susan Andrews

• É americana e tem 66 anos (em 2012)
• Psicóloga, antropóloga e monja, estudou em Harvard e viveu 23 anos na Índia e no Sudeste Asiático
• Conheceu o Brasil durante a Eco-92, quando criou uma comunidade auto-sustentável no interior de São Paulo
• É instrutora de meditação e práticas de biopsicologia

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